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Nutracêuticos e seu uso na pediatria

Nutricionistas: Gabriela Corradi (Unidades de Gastroenterologia e Imunologia - ICrHCFMUSP)
Patrícia Zamberlan (Unidade Neonatal de Cuidados Intensivos - ICrHCFMUSP)*
*Instituto da Criança Professor Pedro de Alcantara do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Atualmente os conhecimentos sobre a bioquímica clínica permitem afirmar que muitos nutrientes não só agem prevenindo e/ou corrigindo deficiências nutricionais, como também, produzindo efeitos benéficos à saúde (BAXTER et alli, 1997).
Os nutracêuticos fazem parte de uma nova concepção de alimentos, que evoluiu no Japão na década de 80, através de um programa de governo para desenvolver alimentos saudáveis, com propriedades medicinais, em virtude do envelhecimento da população diante do aumento de sua expectativa de vida (COLLI, 1998).
Functional food, designer food, therapeutic food, nutraceuticals, pharmafood, medical food, são termos atribuídos, no final dos anos 80 a alimentos, ou partes de alimentos, que proporcionam benefícios médicos ou de saúde, incluindo a prevenção e o tratamento de doenças (CÂNDIDO & CAMPOS, 1995). Melhor dizendo, alimento funcional é qualquer alimento ou ingrediente que tenha impacto positivo na saúde individual; performance física, ou estado mental; além de seu valor nutritivo (HARDY, 2001).
Questões sobre a segurança e as alegações de propriedades funcionais devem ser cientificamente demonstradas e apresentar significância biológica e estatística.
Na Comunidade Européia, embora as alegações de propriedades funcionais estejam proibidas, existe um projeto extensivo de revisão de leis relacionadas aos alimentos de uma forma geral. Paralelamente, em cada país da comunidade, tais como Bélgica, Holanda, Reino Unido e Suécia, foram elaboradas normas próprias baseadas em consensos entre cientistas, autoridades governamentais e indústrias.
Nos EUA, em virtude da não existência de uma definição legal sobre alimentos funcionais, suplementos dietéticos em forma de tabletes ou similares podem ser considerados alimentos funcionais (KWAK & JUKES, 2001).
No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde emitiu a Resolução n°18 de 30/04/99, que estabelece diretrizes básicas para a análise e comprovação de propriedades funcionais e/ou de saúde, alegadas em rotulagem de alimentos e define "alimento ou ingrediente que alegar propriedades ou de saúde pode, além de suas funções nutricionais básicas, quando se tratar de nutriente, produzir efeitos metabólicos e/ou fisiológicos à saúde, devendo ser seguro para o consumo sem supervisão médica" (BRASIL,1999).
A regulamentação de Alimentos Funcionais e Novos Alimentos no Brasil está disponível nas seguintes Resoluções: ANVS/MS 16/99; ANVS/MS 17/99; ANVS/MS 18/99; ANVS/MS 19/99 publicadas no DOU em 03/05/99.
Em sua última resolução, o Codex Alimentarius (1999) definiu dois tipos de alegação de maior relevância: de melhora da função (tipo A) ou de redução no risco de doença (tipo B). A alegação de melhora da função (tipo A) refere-se a(s) conseqüência(s) positiva(s) de interações entre os compostos dos alimentos e funções no organismo sem referência direta à redução no risco de qualquer enfermidade. Exemplos incluem a prevenção do estresse oxidativo. A alegação de redução de risco de doença (tipo B) refere-se à redução no risco de doença pelo consumo de componentes alimentares específicos. Exemplo de tais alegações é a redução do risco de doença cardiovascular ou câncer (ROBERFROID, 1999).
Assim, os alimentos funcionais devem ser seguros, sendo necessário providenciar dados médicos e nutricionais que esclareçam os efeitos benéficos destes alimentos; documentação sobre a ingestão diária para produzir tais efeitos; assim como a estabilidade dos componentes ativos e detalhes sobre suas análises quantitativas (HUGGET & VERSCHUREN, 1996).
Dentro desta nova concepção de alimento, que previne e/ou reduz os riscos de doenças crônicas não-transmissíveis; promove manutenção da saúde e modificações benéficas das funções fisiológicas; os alimentos funcionais podem ser classificados em três grupos (PARK et alli, 1997):
a Alimentos com propriedades imunomodulatórias, que atuam modulando e ativando os componentes celulares e seus mediadores químicos, aumentando a efetividade do sistema imune contra diferentes antígenos, evitando o aparecimento de patologias no organismo. Neste grupo se inserem os compostos químicos presentes em frutas, hortaliças e chás, como o beta-glucano e os compostos fenólicos (catequinas, flavonóides); além dos probióticos e prebióticos.
Os prebióticos são ingredientes alimentares não digeríveis que acarretam benefícios à saúde por estimular, seletivamente, atividade bacteriana no cólon. Os frutooligossacarídeos (FOS), presentes em alguns alimentos como banana, chicória e cebola, são considerados prebióticas. Os probióticos são organismos vivos (como lactobacilos) que exercem equilibrando a flora intestinal, alguns feitos benéficos ao organismo: aumento da digestão e tolerância à lactose (em indivíduos intolerantes); atividade anticarcinogênica, redução dos níveis de colesterol; síntese de vitaminas do complexo B; aumento da absorção de cálcio e modulação do sistema imunológico. Podem ser ingeridos através do consumo de iogurtes, leites fermentados, ou mesmo cápsulas. Já os simbióticos são uma mistura de prebióticos e de probióticos.
a Alimentos com atividade antioxidante, que agem nos sistemas biológicos, eliminando oxidantes (radicais livres) ou impedindo sua transformação em produtos mais tóxicos (WONG, 1995). Como nutrientes antioxidantes podemos citar as vitaminas E e A (beta-caroteno); a vitamina C; os oligoelementos como zinco, cobre, selênio e magnésio; além de componentes ativos como os terpenóides (carotenóides, encontrados na cenoura, abóbora, batata-doce, frutas cítricas; e licopeno encontrado no tomate e melancia).
a Alimentos com ácidos graxos poliinsaturados ômega-3 e ômega-6, que são ácidos graxos essenciais, uma vez que o organismo não pode sintetizá-los. O ômega-3 (alfa-linolênico) é encontrado de forma abundante nos vegetais verde-escuros e óleo de peixe. É precursor dos ácidos eicosapentanóico (EPA) e docosahexanóico (DHA), que são integrantes das membranas celulares, e desempenham importante função no funcionamento da retina e desenvolvimento cerebral.
O ômega-6 (linoléico) dá origem ao ácido araquidônico (AA), que é constituinte da membrana fosfolipídica e precursor de outros compostos importantes, como prostaglandinas, prostaciclinas, tromboxanos e leucotrienos, os quais intervêm na regulação da pressão sanguínea, freqüência cardíaca, coagulação sanguínea, dilatação vascular e resposta imunológica (EUCLYDES, 2000). Pode ser encontrado nos óleos vegetais - soja e milho.
Hoje, frente aos prováveis benefícios que podem exercer no organismo, os alimentos funcionais têm sido cada vez mais enfatizados e preconizados na alimentação humana. Diante do fato de que cada vez mais se acredita que a nutrição, desde a concepção do ser vivo, programa efeitos para toda a vida sobre a saúde, doenças e riscos de mortalidade; os alimentos funcionais ganham importante destaque, também, na alimentação infantil.
Como o curso da evolução da criança pode ser influenciado pela ingestão de quantidades específicas de vários nutrientes, um crescente interesse vem surgindo na produção e na inclusão de fatores bioativos em alimentos infantis, principalmente em formulações lácteas. Atualmente encontramos formulações lácteas com acréscimo de minerais (cálcio, ferro, zinco); ácidos graxos polinsaturados de cadeia longa (LCPUFAS), essenciais principalmente aos recém-nascidos prematuros, pela imaturidade metabólica que apresentam, e que dificulta o alongamento e dessaturação desses ácidos em seus derivados; nucleotídeos, com o objetivo de produzir benefícios gastrointestinais e imunológicos; probióticos e prebióticos, a fim de reduzir as bactérias potencialmente nocivas, proporcionando a redução do risco de diarréia e de outras infecções intestinais. Todas essas inclusões têm sido planejadas e desenhadas, tendo como modelo a composição perfeita do leite humano (proteínas, enzimas, fatores de crescimento e defesa), talvez o "mais funcional" dos alimentos que se tem conhecimento.
Apesar das divergências quanto à conceituação, recomendações e uso dos alimentos funcionais ou nutracêuticos, existem evidências científicas consistentes que fundamentam a prevenção de várias doenças através da ingestão de frutas, verduras e cereais. Na verdade, há muito tempo é sabido que uma alimentação balanceada pode prevenir e tratar muitas doenças; já que os alimentos são os mais antigos remédios utilizados no universo.

Referências Bibliográficas:

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Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução n° 18 de 30 de abril de 1999. Aprova o regulamento técnico que estabelece as Diretrizes Básicas para Análise e Comprovação de Propriedades Funcionais e/ou de Saúde Alegadas em rotulagem de Alimentos. Diário Oficial da União da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: 1999.

Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resoluções de 16 a 19 de abril de 1999.

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Park YK, Koo MH, Carvalho PO. Recentes progressos dos alimentos funcionais. Bol Soc Bras Ci Tecnol Aliment 1997; 31(2): 200-6.

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Euclydes MP. Nutrição do lactente: base científica para uma alimentação adequada. 2° ed. Viçosa: Revista Atual; 2000.

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