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Acompanhamento em longo prazo dos fatores de risco cardiovascular em crianças

Acompanhamento em longo prazo dos fatores de risco cardiovascular em crianças após uma intervenção contra obesidade

Thais Cardoso Benedetti
Aluna do Centro Universitário São Camilo
Estagiária do Ambulatório de Nutrição Clinica do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia 

 

O artigo demonstra os resultados de um estudo realizado por pesquisadores da divisão de Epidemiologia do Instituto de Pediatria Social e Medicina adolescente de um hospital universitário da Alemanha. Trata-se do monitoramento a longo prazo dos fatores de risco para doença cardiovascular em crianças submetidas a uma intervenção para obesidade.

Primeiramente, os autores destacam o aumento da prevalência da obesidade infantil, chamando a atenção para o fato de que crianças obesas tendem a se tornar adultos obesos. Algumas crianças obesas, já desde pequena idade, apresentam um perfil aterogênico que contribui para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, perfil este caracterizado pela presença da elevação da pressão arterial, redução do HDL-c, aumento do LDL-c e triglicérides e resistência à insulina, sendo possível verificar também a presença de síndrome metabólica. Diante do exposto, os autores sugerem que a estratégia mais apropriada para redução dos riscos cardiovasculares é a mudança da composição corporal, com perda de peso e redução do IMC. O objetivo proposto era acompanhar crianças obesas submetidas à uma intervenção para perda de peso com duração de 1 ano, a fim de se verificar as mudanças de peso e perfil aterogênico, além de verificar se os resultados obtidos se mantiveram durante o período de 1 ano após o término do programa.

A amostra foi caracterizada por 240 crianças obesas com idade entre 6 e 14 anos, atendidas no hospital. As crianças deveriam mostrar seu interesse e comprometimento respondendo um questionário sobre seus hábitos alimentares e engajar-se em um programa em grupo de atividade física para crianças obesas com duração mínima de 8 semanas. Posteriormente, a amostra foi dividida em um grupo controle com 37 crianças que, apesar de atenderem aos critérios de seleção, moravam longe demais para participar do programa. O grupo-controle constituiu-se de 203 crianças, já que houveram 29 desistências.

A intervenção proposta chamou-se “Programa Obelix”, baseado em um popular personagem europeu, e seus fundamentos principais eram a prática de atividade física, educação nutricional e terapia comportamental, incluindo acompanhamento psicológico individual e familiar. A meta do programa era a redução de peso e a melhora do perfil aterogênico por meio de mudanças no estilo de vida. O programa intervenção teve a duração total de 1 ano e foi dividido em 2 fases: a primeira fase teve duração de 3 meses, chamada de “fase intensiva”, na qual as crianças participavam de aulas de educação nutricional e comportamento alimentar duas vezes por mês. Foram 6 aulas com duração de uma hora e meia cada uma. Nesta mesma fase, os pais participavam de um curso duas vezes por mês e as crianças tinham o acompanhamento psicológico duas vezes ao mês e prática de atividade física semanalmente. Passados os 3 primeiros meses, o programa entrou em sua “fase de estabilização”, com duração de 9 meses, na qual não havia mais aulas de educação nutricional e houve redução gradativa dos encontros. Nas aulas de educação nutricional, foi proposta uma dieta otimizada, baseada nas preferências e hábitos da população local, caracterizada por 30% de lipídeos, 15% de proteínas e 55% de carboidratos, restringindo os açúcares a até 5%. A dieta adotada pela maioria das crianças na Alemanha atualmente, tem 38% de lipídeos, 13% de proteínas e 49% de carboidratos, sendo 14% de carboidratos simples. Como forma de reduzir o consumo de gorduras e açúcares, os alimentos ricos nestes nutrientes foram divididos de forma didática em um sistema de semáforo, no qual os alimentos classificados em vermelho não deveriam ser consumidos, os laranjas deveriam ter sua porção levada em conta e os verdes poderiam ser consumidos em caso de fome ou sede. Foram consideradas obesas as crianças com IMC > P 97 e, para análise da perda de peso, foi feita a correção proposta por Cole e cols., que classifica o IMC por meio do escore-z baseado na distribuição normal e desvios-padrão. A análise dos fatores de risco para doença cardiovascular foi feita através de exames bioquímicos com dosagens de triglicérides, LDL-c, HDL-c, insulina plasmática, HOMA-IR e aferição de pressão arterial.

Na fase pré-intervenção, as variáveis antropométricas e bioquímicas das crianças obesas foram comparadas às de um grupo de crianças eutróficas e saudáveis, evidenciando o perfil aterogênico das crianças obesas, visto que estas possuíam maior IMC, pressão arterial e pior perfil lipídico e glicídico.

Como resultado, verificou-se que as crianças que conseguiram reduzir seu IMC obtiveram melhora nos fatores de risco para doença cardiovascular, com destaque para aumento de 7% do HDL-c, redução de 5% do LDL-c, redução de 12% dos triglicérides, redução de 8% da pressão arterial, redução de 13% da insulina plasmática e redução de 17% da resistência à insulina.

Quanto à redução do IMC, 72% (n=126) das crianças obtiveram este resultado, mantido durante o período de 1 ano após o fim do programa. É curioso destacar que os autores verificaram que as crianças que não obtiveram redução do IMC eram significativamente mais velhas que as que conseguiram este resultado, levando à suposição sobre as mais novas estarem mais susceptíveis às escolhas dos pais e as mais velhas terem maior livre-arbítrio e opinião própria. Comparando-se o grupo intervenção com o grupo controle, verificou-se que o primeiro grupo, ao final do acompanhamento, possuía pressão arterial 8% menor, triglicérides 19% menor, LDL-c 9% menor, HDL-c 8% maior, insulina plasmática 29% menor e HOMA-IR 28% menor.

Diante do exposto, fica claro que a adesão ao programa levou à redução do peso e consequente melhora dos fatores de risco associados ao desenvolvimento de doenças cardiovasculares, sendo possível demonstrar que estes continuaram com tendência de melhora mesmo após 1 ano depois do fim da intervenção. Verifica-se, portanto, a importância do acompanhamento multidisciplinar desta população tá específica e delicada, levando à ponderação sobre quando o profissional nutricionista deve intervir, visto que o estudo demonstrou que quanto mais precoce a intervenção, melhor. Com os resultados obtidos, verifica-se a importância da educação nutricional desde a educação fundamental. Sugere-se a realização de mais estudos como tal no Brasil, para delineamento mais preciso dos hábitos da população infantil local e com maior amostra, a fim de se verificar se os resultados obtidos podem ser extrapolados para a população em geral.

Referência: REINEHR, T.; DE SOUSA, G.; TOSCHKE, A. M.; ANDLER, W. Long-term follow-up of cardiovascular risk factors in children after an obesity intervention. Am J Clin Nutr, v.84, p.490-496, 2006.

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